terça-feira, 24 de dezembro de 2013

É UM VALE TUDO NA CODESP

Porto de Santos, um loteamento político

  • Enquanto empresas travam batalha por mais espaços, administração da Codesp é ineficiente e está sob risco
Cleide Carvalho (Email)
Publicado:
Guerra comercial. O Porto de Santos em operação: parte da expansão das empresas ocorre sobre área de mangue Foto: Andrew Harrer/Bloomberg News/21-11-2007
Guerra comercial. O Porto de Santos em operação: parte da expansão das empresas ocorre sobre área de mangue Andrew Harrer/Bloomberg News/21-11-2007
SÃO PAULO - Maior da América Latina, por onde transitam quase R$ 120 bilhões por ano em mercadorias, o Porto de Santos foi loteado por políticos. A administração e os conselhos fiscal e administrativo têm cargos repartidos entre PSB, PT, PR, PDT e até o DEM, herdeiro de cargos do PTB.

Foi este loteamento que levou a dupla petista Paulo Rodrigues Vieira, ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA), e Evangelina Almeida Pinho, ex-superintendente da Secretaria do Patrimônio da União em São Paulo (SPU), a circular pelos negócios milionários do porto. Apenas dois desses negócios, a cessão da Ilha de Bagres e a ampliação dos terminais da Tecondi, valem mais de R$ 5 bilhões.

Alvo dos interesses partidários, a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) vê balançar seu papel de autoridade portuária. Em 2011, enquanto Vieira esteve no conselho de administração, Evangelina estava no conselho fiscal, na vaga destinada ao Ministério dos Transportes. Uma das figuras mais desenvoltas no porto hoje é o médico Fausto Figueira, ex-deputado estadual petista, que fez dobradinha com Ricardo Berzoini (PT) em 2010. Figueira é visto quase como um porta-voz da Codesp, em lugar do presidente da companhia, Renato Ferreira Barco, funcionário de carreira.

— Ninguém chega ao Porto de Santos sem indicação de um político. Todos têm um padrinho. O problema é que ficam sujeitos a atender interesses políticos — diz Everandy Cirino dos Santos, presidente do Sindaport, sindicato que reúne os empregados na administração portuária.

Valdemar fez indicação
O Porto de Santos sempre foi alvo de influência política. No passado, o ex-governador Mário Covas defendia os interesses portuários. Ele era santista e buscava desenvolvimento para a região. Foi no governo Fernando Henrique Cardoso que o atual vice-presidente, Michel Temer (PMDB), em troca de apoio e articulação na Câmara, garantiu indicações na diretoria da Codesp. Por conta do porto, Temer foi investigado, mas o processo foi arquivado no Supremo Tribunal Federal por falta de provas.

Manuel Luís, o superintendente da área jurídica da Codesp, é da cota do deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP), condenado no mensalão. Os textos de Manuel são considerados objetos de inspiração para Paulo Vieira nos dribles às regras que impediam a Tecondi de assumir áreas do porto sem licitação. O contrato foi anulado pela Justiça paulista. Carlos Cesar Floriano, o homem da Tecondi envolvido no esquema de Vieira, foi indiciado na Operação Porto Seguro. O problema é que a Tecondi foi vendida este ano. Ou seja, já está em outras mãos.

O Ministério Público Federal (MPF) em Santos tem pelo menos dez investigações em curso para apurar irregularidades na cessão de áreas portuárias. Com o crescimento do volume de cargas, as empresas se digladiam por espaços. Parte da expansão ocorre sobre uma área de mangue. Quando perde na Justiça, a maioria das empresas argumenta que já investiu nos terrenos — e a União cede, pois as indenizações reclamadas são monstruosas e a Codesp diz que não teria como pagar.

— A Constituição diz que toda área pública deve ser licitada, mas não é o que acontece. Sempre que falamos em interromper uma atividade, apelam para a necessidade de exportar, de não comprometer a economia — diz o procurador Antonio Morimoto, do MPF em Santos, que defende a realização de perícia geral nas áreas do porto.

Investimentos já feitos pela Tecondi foram usados como argumento pelo auditor do Tribunal de Contas da União Cyonil Borges, no parecer que escreveu a favor da empresa, por encomenda de Vieira, que ofereceu propina de R$ 300 mil.

Em abril passado, numa ação popular, o Tribunal de Justiça de São Paulo mandou anular o contrato de adensamento da empresa Marimex. Na sentença, o juiz disse que ela arrendou 25 mil m² em 1987, e hoje ocupa 102.773,45 m², sem licitação. Houve recurso.

Procurada pelo GLOBO para dar esclarecimentos, a assessoria da Codesp informou, em nota, que os adensamentos são baseados na Lei dos Portos, que permite não fazer licitações para áreas contíguas aos terminais arrendados ou quando demonstrada a inviabilidade técnica, econômica e operacional de licitar a área, por exemplo.

A administração da Codesp custa R$ 2,4 milhões por ano. Cada conselheiro recebe R$ 2.600 por reunião. A gestão é alvo de críticas. Um grupo de 464 empresas deve mais de R$ 1 bilhão à Codesp, em 64 mil faturas não pagas. Uma das devedoras, a Libra, tem representante no conselho fiscal da companhia. O porto enfrenta ainda 3 mil ações trabalhistas, acumulando dívida de R$ 197 milhões. É comum a empresa nem recorrer e perder a ação, dizem sócios minoritários.

Tertulina Vasconcelos, gerente de contencioso trabalhista, foi candidata pelo PSB a deputada estadual. Ciro Gomes (PSB-CE) indicou Pedro Brito para o cargo de titular da Secretaria de Portos. Mauro Lima Júnior, presidente do conselho de administração da Codesp, foi da Ceará Portos, empresa portuária do estado de Ciro.

O diretor financeiro, Alencar Severino da Costa, foi indicado por Carlos Lupi (PDT), ex-líder ministro do Trabalho. O diretor de infraestrutura, Paulino Vicente, é da cota do PTB, agora repassada ao DEM porque seu padrinho mudou de partido.

As indicações políticas levaram o acionista minoritário José Francisco Paccillo a fazer constar em ata que os indicados não apresentam currículos antes de serem eleitos para o conselho.

— O porto precisa de eficiência. Não pode ter tantos profissionais vinculados a políticos ou grupos políticos. Se o governo vendesse parte das ações em Bolsa de Valores, haveria mais fiscalização, mais transparência — critica Paccillo.

Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/pais/porto-de-santos-um-loteamento-politico-6985989#ixzz2oPfxSuTO

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